junho 07, 2004

RTP1 endireita-se para o torto

Telejornal, RTP1, canal do Estado, domingo, horário nobre, 20 horas. Depois de abrir com uma peça sobre o risco de atentados no Euro 2004, José Rodrigues dos Santos dá entrada a uma série de peças sobre a morte de Ronald Reagan, peças essas que o próprio «pivot», responsável pela informação do canal, devia logo a seguir deitar ao caixote do lixo e deitar-lhe fogo.

Foram para aí uns dez minutos, talvez. Reagan, o homem das «firmes convicções», o «carismático», o «herói», o adorado pelo povo, tudo isto segundo a opinião expressa pelo jornalista de serviço no obituário do antigo presidente dos EUA, um actor de segunda que chegou ao patamar mais alto da nação. Só na América...

O cidadão desarmado, o jovem sem memória, chegaria ao fim de ver esta enfiada de peças com a sensação de que Reagan foi o maior presidente de todos os tempos, uma espécie de imaculado super-herói das massas que, imagine-se, derrubou, com a sua fictícia 'Guerra das Estrelas', o império soviético e o muro de Berlim.

Todas as pessoas que apareceram nas peças a perorar, com excepção de Mário Soares (versão soft), colocaram Reagan no altar da prodigalidade histórica: quatro simples cidadãos anónimos (patrióticos americanos) a garantir ao mundo que Reagan foi o maior, pá, Durão Barroso, Cavaco Silva e... até o insignificante do Paulo Portas apareceu a tecer loas ao grande amigo do Papa e da Thatcher.

Não foi dado a ver ao telespectador uma simples voz dissonante. Um contrapontozinho, como mandam as regras jornalísticas. E nem o jornalista que escreveu os textos se dignou a fazer uma referenciazinha que fosse ao facto de Reagan ter protagonizado o escândalo Irão-Contras, ao facto de ter deixado um défice colossal, o falhanço da quimérica 'Guerra das Estrelas'... nada.

Foi um momento de informação televisiva estatal da pior espécie: acéfala, servil e incompetente.