novembro 30, 2004

Uff...

A partir de hoje, após quatro meses para o país apagar da sua memória colectiva, Portugal volta a poder respirar. Sampaio, escaldado, aproveitou o pontapé que o ministro do Desporto deu na incubadora deste governo infantil para acabar com a pândega circense que se havia instalado.

Santana Lopes vai concorrer às eleições. Está bem. Vê-se que aprendeu pouco ou nada com o borrada política que andou a fazer nas últimas semanas. Deve pensar que os eleitores portugueses são todos como aquela turba ululante, um nada acéfala, com que lidava nas assembleias gerais do Sporting ou nos congressos partidários.

Façamos votos para que, em Fevereiro de 2005, o país regresse ao século XXI, de onde nunca deveria ter saído pela mão de Lopes, Portas, santanettes várias e companhia, quase toda muito pouco recomendável.

novembro 28, 2004

Venham cavacos. O país precisa.

Cavaco Silva escreve esta semana no Expresso um texto absolutamente arrasador para a classe política no activo. Santana Lopes deve ter ficado com vontade de mandar fechar o semanário de Balsemão, mas uma Cinha qualquer deve ter dito ao homem que S. Bento não é bem a mesma coisa que o concurso A Cadeira do Poder.

O grave é que Cavaco está coberto de razão, em particular quando diz que os políticos incompetentes devem ser corridos por quem sabe. Soares também, quando pinta de muito negro o presente deste quintal de dez milhões de almas meio perdidas. Guterres acerta em cheio quando fala do circo entre os média e a política. Durão não pode dizer nada porque fugiu, o covarde.

A Cavaco, a Soares, a Guterres já chamaram os nomes feios todos que o dicionário tem. Algumas vezes, com razão. Mas, agora que os portugueses provaram o bom que é terem uns totós de alto astral e inteligência subterrânea a dirigi-los, aqueles "velhos" políticos parecem vir de outra galáxia, onde ainda existem alguns princípios, alguma verticalidade, decência, respeitabilidade, sentido de serviço à causa pública, enfim, maturidade, apesar de tudo. Venham eles outra vez. Soares, Cavaco, Guterres, Freitas, a presidente ou primeiro-ministro. Qualquer um destes veneráveis políticos é um senhor quando comparado com os cachopos que hoje se comem vivos uns aos outros nos bastidores esquizofrénicos da nossa cosmopolita vida política lisboeta.

Andou tanta gente a sacrificar-se no século XX para chegarmos a isto?

novembro 25, 2004

Alarmices

Anda por aí muito boa gente com medo de que o poder caia na rua. Ora, não há, em rigor, razões para tanto alarme. É que, nos últimos meses, o poder já caiu. Num esgoto.

novembro 19, 2004

A caminho de 2046

Este é dos tais filmes que nos conquista mesmo antes de ser visto. 2046, do realizador Wong Kar Wai, acaba de estrear nas salas portuguesas.
Na Web, o site oficial de 2046 é uma pequena obra-prima de design, forma e cor. Vale a pena espreitá-lo. Quanto mais não seja, como aperitivo para a verdadeira fita.

novembro 18, 2004

A cor das notícias

O lapso de tempo entre a saída de Marcelo da TVI e o relatório agora apresentado pela Alta Autoridade para a Comunicação Social é, a vários títulos, histórico para a comunicação social em Portugal. A partir daqui, algumas coisas nunca serão como dantes. E ainda bem.

O caso Marcelo acabou por ser o detonador de várias bombas que estavam, há muito, à espera de rebentar. E só não explodiram antes porque os media sempre tiveram o cuidado de não apontar o dedo a si próprios e também o de dificultarem a vida a quem o quisesse fazer, tanto a partir de dentro, como de fora.

Deste curto período, a TVI sai chamuscada. Paes do Amaral ficou com a sua imagem de empresário manchada pelo calculismo e oportunismo e, diga-se, por alguma ingenuidade demonstrada na gestão deste imbróglio.

O governo, se já andava a dar canhoadas nos pés a toda a hora, enterrou-se até ao pescoço com as "bocas" infelizes de Gomes da Silva e de Morais Sarmento. Este passou a ser o governo da "censura" e do "controlo" da comunicação social, o governo da colocação dos seus "boys" em jornais, rádios e na televisão pública. A demissão, em bloco, da direcção da RTP é uma espécie de corolário lógico destas semanas loucas. Acresce que Santana e os seus muchachos fizeram tudo isto com um inacreditável amadorismo. Das nódoas desta barraca, não se livram tão cedo.

Mas quem, talvez, sai pior na fotografia é a PT. Cometeu muitos erros em muito pouco tempo, agravou-os, aos olhos de toda a gente, de forma grosseira (a forma como foram demitidos Granadeiro e Fernando Lima e o "caso" Clara Ferreira Alves, por exemplo), permitindo que passasse a ser olhada como coutada do governo. Tanto que agora, e bem, a Alta Autoridade vem propor que a PT venda os seus media para acabar com as promiscuidades. Há um pequeno problema: as eleições vêm aí.

Para os cidadãos que se querem esclarecidos, desta história ficou também um boa moral: é preciso ter muito cuidado com as cores que as notícias trazem atrás de si.

novembro 17, 2004

Martelada na foice

Jerónimo de Sousa secretário-geral do PCP é uma violenta martelada naquela já de si muito torta foice.

novembro 15, 2004

bora lá com a Cinha!

Está desfeito o mistério à volta de uma premente questão de Estado que andava por aí à solta e que se traduzia na pergunta: por que razão Santana Lopes insistira tanto com Cinha Jardim para ela não ir para a Quinta das Celebridades? Ora: porque o nosso primeiro já tinha em mente mandar José Rodrigues dos Santos para a quinta dos infernos.

A única questão verdadeiramente importante, realmente palpitante, que se coloca agora é a de saber quem a Cinha vai escolher para suas adjuntas à frente do serviço público.

Um conto budista

Primavera, Verão, Outono, Inverno... e Primavera é, a todos os títulos, um belo filme. Dele dizem tratar-se de um conto budista. Talvez seja uma boa síntese.

O realizador, o sul-coreano Kim Ki-duk, sintetiza desta maneira: «Tentei retratar a alegria, a ira, a tristeza e o prazer das nossas vidas através de quatro estações e através da vida de um monge que vive num templo rodeado apenas pela natureza.»

Desta obra muito haveria a dizer e a escrever, sendo certo que alguns sentidos da espiritualidade oriental nos escapam, certamente, a nós, ocidentais. Mas o mínimo que se pode dizer é que este é um filme que nos lava a alma.

A não perder, portanto. Está em exibição no Porto, no (em muito boa hora) renovado cinema Passos Manuel. O site que a Sony fez para Primavera, Verão, Outono... e Primavera merece também uma espreitadela.

novembro 11, 2004

As telas do Porto

A cidade do Porto, esta atrasada segunda cidade do país, lá vai saindo, devagarinho, da idade das trevas cinematográficas em que se encontra mergulhada há já algum tempo.

A vaga de encerramentos de salas nos últimos anos deixou a Invicta na mais absoluta penúria, com menos de meia dúzia de espaços. O povo fugiu todo para os shoppings de Gaia, Matosinhos, Gondomar, onde se empanturra alegremente com pipocas e cinema de Hollywood.

O cartaz de cinema de hoje, no entanto, oferece uma alternativa prometedora: o cinema Passos Manuel, ali ao lado do Coliseu, reabriu e parece apostar em cinema com "C" grande. Primavera, Verão, Outono, Inverno... e Primavera, de Kim Ki-duk, é um excelente pontapé de saída.

O mesmo proprietário do Passos Manuel também é o responsável pela programação da sala-estúdio do Teatro Campo Alegre. Lá poderemos ver Segunda de Manhã, de Otar Iosseliani.

Estes dois filmes há muito foram exibidos em Lisboa. Caso o Passos Manuel e a sala-estúdio do Campo Alegre não existissem, provavelmente não seriam mostrados no Porto. Pelos menos, tão cedo.

Apesar destes passinhos positivos, a cidade continua a precisar de uma cinemateca como de pão para a boca. Mas se nem um mísero canal de televisão regional consegue aguentar...


novembro 06, 2004

Lenha para a fogueira

Era previsível. Quando, um dia, se mexesse a sério no vespeiro que é o mundo das ligações obscuras entre o poder político, e outros poderes, com a comunicação social, o efeito seria de dominó. Nos últimos tempos, quase diariamente, as peças vão caindo umas sobre as outras, deixando a nu a podridão do jogo.

No Público de hoje, mais lenha para a fogueira: As agências de comunicação e o poder .

No Expresso, a crónica de Clara Ferreira Alves é de leitura obrigatória. Título: Os «merdia».


novembro 05, 2004

Os mandamentos de Savater

«Todavia, nós, os não-crentes, acreditamos nalguma coisa: no valor da vida, da liberdade, e da dignidade, e que o gozo dos homens está nas mãos deles e de mais ninguém. São os homens que devem enfrentar com lucidez e determinação a sua condição de solidão trágica, porque é essa instabilidade que abre caminho à criação e à liberdade.»

Fernando Savater, Os Dez Mandamentos no Século XXI.

novembro 04, 2004

Dedo em feridas do jornalismo

O constitucionalista Vital Moreira pôs hoje o dedo nalgumas feridas do jornalismo que os próprios jornalistas parecem, por vezes, nem sequer reconhecer que as têm.

Primeiro: há uma relação de "promiscuidade" entre os jornalistas e os governos. Não serão todos os jornalistas, nem sequer a maioria, mas os que existem são em número suficiente para dar cabo do bom nome da profissão. O recente desfile de misérias na Alta Autoridade para a Comunicação Social trouxe muito deste lixo à superfície. Entretanto, a passeata obscena entre redacções e assessorias de todo o tipo prossegue, perante a apatia inexplicável, e escandalosa, do Sindicato dos Jornalistas.

Segundo: Vital Moreira defende a criação de uma entidade reguladora e fiscalizadora dos profissionais da comunicação social. É evidente que essa entidade já há muito deveria existir. Talvez não se tivesse chegado ao pântano em que hoje boa parte do jornalismo nacional está enterrado. O jornalismo anda hoje em roda livre, entregue a si próprio e a uma mirífica "auto-regulação" que só serve para os jornalistas se enganarem a si próprios, enquanto as condições de exercício da profissão se vão deteriorando gravemente a vários níveis. É uma verdade tão simples quanto estapafúrdia: o jornalista que viola o código deontológico da profissão não tem qualquer sanção. Pelo menos, que se veja...

novembro 03, 2004

Pobre América

A América lúcida, aquela que vive no século XXI, está de luto. O resto do planeta também.