novembro 27, 2008

Fotograma: Monica Vitti

Giuliana (Monica Vitti) e os seus insondáveis estados de alma em chamas captados por Antonioni em Deserto Vermelho.

novembro 22, 2008

Sítios de Outono


É ímpar a beleza das cores de Outono. Os miúdos "Tokyo Hotel" passam em bando com as calças desfalecidas sobre os joelhos, atropelando o andar. As miúdas esganam o rabo na ganga e olham-se ao espelho no telemóvel, em contínuo movimento perpétuo pela rua fora. Mulheres com trote de macho latino praguejam à bruta. Os engravatados dos topos de gama cumprem religiosamente os seus rituais sagrados: abrem a porta das viaturas e cospem na estrada. O engraxador do Marquês está lá, no sítio de sempre, ao lado do quiosque com mulheres nuas na capa, à espera que o sapato lhe chegue à graxa. Parece uma fotografia. O homem das patilhas grandes e olhar perdido no horizonte sentado à mesa do Guarany também. Tem ar de quem perdeu alguém, há muito tempo. Quando não olhamos para trás, o mar da Foz é bom, como sempre. A cidade borra-se de graffiti e betão. As folhas caídas amparam-nos o caminho nos jardins. Na estação do metro, o tempo pára. Dava uma boa fotografia. E arranca. O último filme do Greenaway é a sua cara, mas falta qualquer coisa àquele Rembrandt. Espera-nos o Deserto Vermelho. É bom ouvir o Outono. O tempo não espera por ninguém. E ainda há tanto para ler, ver e ouvir... Como se chama mesmo aquele músico com nome esquisito? Deixa-me escrever. Vidna Obmana. O mundo é demasiado grande para nos darmos ao luxo de estarmos sempre no mesmo sítio.


Discover Vidna Obmana!

novembro 14, 2008

A escrita eterna de Savater

Regresso à escrita de um velho amigo. Amigo de horas sem fim a lê-lo. Com aquele prazer de quem, como dizia Borges, abre os livros em busca de sabedoria.

Em A Vida Eterna, Fernando Savater convida-nos a acompanhá-lo numa reflexão sobre a religião, a razão, a morte e a vida eterna. Vida eterna em que ele, como «modesto ateu» convicto, não acredita: «Estas reflexões incertas acerca da vida eterna são fraternalmente dedicadas a todos os que nela não acreditam».

O livro, naturalmente, "engata-nos" logo nas primeiras levas de leitura. Outra coisa não seria de esperar de uma obra que nos recebe com um excerto da Metafísica, de Alberto Caeiro:

«Que ideia tenho eu das coisas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?
Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
da minha janela (mas ela não tem cortinas)...»