Quando o filme foi estreado, nalgumas salas europeias foi preciso chamar a emergência médica para auxiliar espectadores que se sentiram mal durante a projecção. Em Vem e Vê, mais do que explícita, a violência, sobretudo de ordem psicológica, é latente, persistente e sufocante. Não obstante, no meio do horror da história, Elem Klimov oferece-nos, combinadas com uma banda sonora arrepiante, imagens cinematográficas de rara beleza.
Durante a II Guerra Mundial, 628 aldeias da Bielorússia foram incendiadas e a sua população queimada viva ou fuzilada pelos nazis. É esta a história, verídica, que Klimov nos conta.
Diz o realizador, numa introdução ao filme (um dos extras do DVD, recentemente lançado em Portugal pela Midas Filmes), que tinha de contar esta história, mesmo que ninguém a fosse ver. Porque ele próprio, natural de Estalinegrado, teve de fugir à perseguição das animalescas SS.
A obra, de 1985, acabaria por ter uma enorme repercussão internacional. Venceu o Grande Prémio Moscovo desse ano. Vem e Vê também passou pelo Cineclube do Porto, mas, enfim, nessa altura, ainda se via cinema fora de casa na Invicta. Hoje, como se sabe, o Porto é um belo necrotério cinéfilo.
Como nota a Midas na sinopse, o herói de Vem e Vê é Florya, um adolescente de 16 anos. Se no início é um rapazinho como tantos outros da sua idade, à medida que ele vai conhecendo o horror das execuções perpetradas pelos nazis, a sua cara vai-se transfigurando e envelhecendo. As transformações no seu rosto são o espelho do rosto da guerra.
A última cena do filme, ao som do requiem de Mozart, é absolutamente memorável. Com o rosto transfigurado e encarquilhado, Florya dispara consecutivamente sobre uma fotografia de Hitler no chão. A cada disparo, imagens reais do ditador e da Alemanha no período nazi surgem a andar para trás, como se Florya quisesse fazer recuar o relógio do tempo. Até aparecer uma foto de Hitler bebé ao colo da mãe. Florya não dispara.